quinta-feira, 24 de março de 2011

Kellog e o grande mastigador (excerto de Em Defesa da Comida, de Michael Pollan)

«O resultado mais conhecido da alimentação pseudocientífica surgiu nos primeiros anos do século XX, quando John Harvey Kellog [vegetariano convicto que inventou, com o seu irmão, os corn flakes] e Horace Fletcher convenceram milhares de americanos a trocar todo o prazer de comer por regimes alimentares de um rigor e de uma perversidade de cortar a respiração. Os dois gurus da alimentação uniram-se no seu desprezo pela proteína animal, cujo consumo o dr. Kellog, um adventista do 7.º dia incrivelmente parecido com o coronel Sanders da KFC, acreditava piamente fomentar a masturbação e a proliferação de bactérias tóxicas no cólon. [...] Na casa de saúde de Battle Creek, dirigida por Kellog, os pacientes (entre os quais se contavam John D. Rockefeller e Theodore Roosevelt) pagavam uma pequena fortuna para se sujeitarem a certas práticas científicas, como por exemplo clisteres de iogurte de hora a hora [...]; estimulação eléctrica e vibração intensiva do abdómen; dietas constituídas exclusivamente por uvas (4 a 6 quilos por dia); e, a todas as refeições, recurso ao método Fletcherizing, que consistia em mastigar cada porção de comida aproximadamente 100 vezes (frequentemente ao som estridente de canções especiais para ajudar à mastigação.) [...]
Horace Fletcher (também conhecido como 'o grande mastigador') não possuía quaisquer credenciais científicas, mas o exemplo da sua extraordinária forma física - aos 50 anos, conseguia subir e descer os 898 degraus do Monumento a Washington sem parar para recuperar o fôlego -, apesar de viver com um regime diário de 45 gramas bem mastigados de proteínas, era prova suficiente para os seguidores*.

*Segundo Levenstein, os cientistas que procuravam descobrir o segredo da exemplar saúde de Fletcher monitorizavam escrupulosamente tanto as suas ingestões como as suas excrecências, notando, relativamente às últimas, como fizeram todos quantos procederam a esta pbservação, a extraordinária ausência de odor»

Michael Pollan, Em Defesa da Comida, págs. 73-74

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