quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

peixe frito

Embora não tenha conseguido, como é seu apanágio, ir à praça no sábado de manhã, o Comilão encontrou boas ovas e carapauzinhos na peixaria do Pingo Doce. E assim preparou uma espécie de fritada mista que acompanhou muito bem com um arrozinho de tomate feito pela mulher do Comilão. (as ovas e os carapaus ficaram no frigorífico ao longo do dia a absorver o sal, que ficou no ponto) Foi pena os carapauzinhos terem pouco que comer e não estarem bem arranjados. Tirando isso, o conjunto estava muito bom (o Comilão é louco por ovas fritas).

Três conselhos apenas para a preparação deste prato:
1. aquecer bem o óleo antes de colocar o peixe
2. não ter pressa em tirar as ovas, deixá-las fritar bem
3. ter o exaustor ligado no máximo

Costeletas de porco preto

O Comilão andava com desejos de fazer entrecosto frito mas a coisa não se proporcionou. Por uma feliz coincidência encontrou, isso sim, duas belas embalagens de costoletas de porco preta, ainda para mais com desconto. Foram preparadas com massa de pimentão, depois fritas em azeite com alho (entretanto retirado para não queimar), um pouco de sal grosso por cima (mas só um pouco), louro, depois cerveja, um pouquinho de vinho do porto, um resto de vinho branco, e ali ficaram longamente a caramelizar até ganharem uma espécie de crosta e uma cor intensa entre o laranja e o castanho.

Estavam formidáveis, ligeiramente adocicadas, como se pretendia, e acompanharam com arroz branco, feijão encarnado (que ligou muito bem) e salada.

4 estrelas

Friedrich Engels, The Condition of the Working Class in England

Há perto de vinte anos que o Comilão tinha o desejo de ler este livro, desde que tomou dele conhecimento durante uma aula de História na escola secundária. Pois bem, há tempos encontrou-o na Almedina, no Saldanha e, embora não fosse o momento mais oportuno para tal, adquiriu-o pelo preço de €12,85.

Engels foi para Inglaterra em 1842, enviado pelo seu pai - «um tirno» - para aprender o negócio num moinho de que o progenitor era proprietário. Foi via Paris, onde se encontrou com Marx, com quem iniciaria uma amizade e uma colaboração para o resto da vida, e chegou a Londres, que o terá impressionado deveras pela sua dimensão, em Novembro de 1842. «Ao longo de 21 meses tive a oportunidade de privar com o proletariado inglês, as suas aspirações, as suas alegrias e arrependimentos, de vê-lo de perto, a partir da observação e contactos pessoais, e ao mesmo tempo pude complementar as minhas observações com o recurso às fontes autênticas. O que vi, ouvi e li foi trabalhado no presente livro». Livro escrito em finais de 1844 e início de 1845no seu regresso à Alemanhan (quando tinha apenas 24 anos), e publicado em Leipzig. Em Manchester, Engels explorou os bairros operários, verdadeiros labirintos miseráveis e insalubres, provavelmente com a orientação de um guia, talvez a irlandesa Mary Burns, que viria a tornar-se sua mulher. Nesta páginas, o autor descreve as condições duríssimas em que viviam os trabalhadores das manufacturas inglesas, as suas casas sem esgotos nem casas de banho (eram imundas instalações comuns), sem cama (apenas um monte de palha), húmidas e mal ventiladas. Nos pátios, onde o lixo e todo o tipo de detritos se acumulavam, o cheiro era particularmente intolerável. Uma família inteira - às vezes até mais - podia viver num quarto, que fazia também de sala de estar e de cozinha, não raro em caves ou sótãos saturados de humidade. Glasgow (págs. 76-77) era das cidades mais sujas e os irlandeses conseguiam tolerar as piores condições, baixando assim o nível de vida dos ingleses (saxões), graças à sua mão-de-obra barata. Estas famílias nada possuíam além dos trapos que traziam vestidos (e com os quais dormiam), a sua alimentação às vezes resumia-se a batatas. A promiscuidade sexual e o álcool eram os seus únicos escapes. Estas condições sub-humanas e a concentração de pessoas nas cidades faziam destas focos de doença. As taxas de mortalidade infantil (contemplando crianças até aos cinco anos) eram assustadoras, atingindo os 50% em Leeds! A exploração das crianças também é abordada, assim como as deformações provocadas por certas tarefas: «Um dos grandes industriais de Manchester, líder da oposição contra os trabalhadores [...] disse em certa ocasião que se as coisas continuassem com o rumo que levam hoje, osoperadores do Lancashire em breve se tornariam uma raça de pigmeus», pág. 178

Também há páginas arrepiantes sobre as casas onde eram recolhidos os mendigos (284-287).

«A falta de higiene, que não é tão nociva no campo, e que é a segunda natureza do irlandês, torna-se assustadora e seriamente perigosa através da sua concentração nas grandes cidades. O Milesiano (irlandês) deposita o lixo e sujeira à porta de sua casa, como estava habituado a fazer na sua terra, e assim acumula poças e montes de detritos que desfiguram os bairros dos operários e envenenam o ar. Constroi uma pocilga contra a parede de casa como fazia na sua terra e, caso o proíbam de fazer isso, deixa o porco dormir no quarto consigo. Este método novo e anti-natural de criar gado nas cidades é de origem irlandesa. O irlandês ama o seu porco como o árabe ama o seu cavalo, com a diferença de que o vende quando está gordo o suficiente para se matar. De outro modo, ele come e dorme com o porco, os seus filhos brincam com ele, cavalgam-no, rebolam-se na terra com ele, como qualquer um pode ver repetido um milhar de vezes em Inglaterra». pág. 123

Friedrich Engels
The Condition of the Working Class in England
Penguin Classics
294 págs.
3-3,5 estrelas
veredicto: um testemunho impressionante das consequências da revolução industrial na Inglaterra de meados do século XIX. partes um bocado chatas e revela por vezes uma visão algo limitada por preconceitos ideológicos sobretudo anti-burgueses.

terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

Ed Koch (1926-2013)

Morreu na sexta-feira, 1.II.2013, Ed Koch, o mayor de Nova Iorque a quem Paul Simon agradece durante o célebre discurso no concerto de Central Park. Exerceu o cargo entre 1978 e 1989, conseguindo resgatar a cidade a uma das suas fases mais negras e difíceis, tornando-a novamente um portento cultural e financeiro. Liderou o renascimento da cidade após a crise económica da década de 70, mas durante os seus três mandatos teve de enfrentar tensões raciais, currupção entre os seus aliados, a epidemia da sida, a proliferação de sem-abrigo e crime nas ruas, que depois Giulianni conseguiria dominar. Não queria abandonar Manhattan e por isso, vendo o fim da vida aproximar-se, adquiriu um talhão no único cemitério onde havia espaço disponível, o de Trinity Church. Para Bloomberg «não havia ninguém que tão bem incorporasse o espírito da cidade de Nova Iorque como ele». Bill Clinton, em representação do Presidente Obama, disse: «Tinha um grande cérebro, mas o coração dele era ainda maior».
Koch é recordado pela sua irreverência, energia e pelo hábito de andar pela cidade a perguntar aos transeuntes 'How'm I doing?' (Que tal me estou a sair?'), revelando-se em geral com demasiada pressa para esperar pela resposta.

Fotografia tirada a 30 de Janeiro de 1975: o arquitecto Philip Johnson, Jacqueline Kennedy, Besse Myerson e Ed Koch após uma conferência de imprensa para salvar o Grand Central Terminal (ao fundo)

O velho Isaías

Há anos que já não vou à Adega do Isaías, em Estremoz. Da última vez que lá fui havia uma fotografia do seu filho, o Zé Marcos, na parede atrás do balcão onde costumava servir-nos abafadinhos nuns copos minúsculos (o Sr. Isaías usava metáforas taurinas, um 'ferro curto', como ele dizia). E o próprio Isaías já tinha falecido. Recordo-me bem de o ver no assador, com os olhos semi-cerrados por causa do fumo, a estender uma peça de entrecosto sobre a grelha como um vendedor de tapetes estende um belo exemplar perante um bom cliente.