Tudo naquela casa sussurrava viuvez:
o corrimão frio e liso das escadas,
a vizinha da frente sempre à espreita,
o telefone preto na entrada.
O cheiro das alcatifas e cortinados,
os naperons,
o quadro da Última Ceia,
os bifes de peru com arroz,
o som dos botões da televisão
quando se mudava de canal,
o pó debaixo do sofá,
onde passava o fio do candeeiro.
Quem diria que já houvera vida naquela casa,
que outrora fora habitada por crianças,
correrias e brincadeiras,
que nem sempre tinha sido uma casa condenada?
Mas o mais triste,
o mais desamparado
era o quarto mal iluminado
com um roupeiro alto onde eu não entrava.
A cama sem um vinco
demasiado vasta para uma pessoa só.
Numa das mesas-de-cabeceira,
um despertador metálico.
Na outra (para dormirem lado a lado)
a fotografia de um jovem fardado –
o retrato tirado em África
a preto e branco do meu avô.
Sem comentários:
Enviar um comentário