terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Os secadores são perigosos?



O título da notícia do Correio da Manhã diz: 'Traficante preso em casa com haxixe e heroína'. A foto mostra o tradicional leque de notas (pelas minhas contas dá cerca de dois mil euros), as tradicionais (e de muito mau gosto) pulseiras em ouro, telemóveis (cinco, nenhum deles muito sofisticado), balas, sabonetes de haxixe, estupefacientes embrulhados em papel de prata, duas facas e ainda... três secadores. Um deles parece-me que até é igual ao que temos lá em casa. Espero que não nos apareçam com um mandado de busca, se não vamos ter problemas. É que as nossas facas de bife parecem cortar melhor do que as do traficante e além do secador temos um arsenal de pequenos electrodomésticos que faria as delícias da PSP: um aspirador de alta cilindrada, uma máquina de iogurtes, uma batedeira, uma máquina de barbear... (estou curioso por saber como disporiam os 300 euros em notas e moedas que encontrariam na registadora da cozinha). E não sei o que pensariam eles dos três ou quatro telemóveis avariados que por lá andam.

Claro que isto é uma brincadeira. Quem percebe alguma coisa do assunto sabe que os secadores servem para secar as folhas de canábis, de modo a depois poderem ser fumadas.

Outra descoberta bem mais preocupante veio noticiada pela CNN esta semana. No Gabão foram presas 5 pessoas relacionadas com o tráfico ilegal de partes de animais mortos. As autoridades encontraram 13 cabeças de primatas, duas mãos de gorilas e 30 de chimpanzés. A apreensão contou ainda com 12 peles de leopardo, uma pele de leão (parcial), peles de cobra e cinco caudas de elefante. Um achado macabro.

sábado, 22 de janeiro de 2011

A Terra é redonda

Já fui até ao fim do mundo
mas afinal o mundo não acabava ali

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Adega do Saloio

O restaurante Adega do Saloio fica em S. Pedro de Sintra, num lugar que tem o belo nome de Chão de Meninos. É um restaurante tradicional português onde vampiro não entra. Passo a explicar: a decoração (como os temperos?) é grandemente feita à base de tranças de alhos penduradas nas vigas de madeira. Uma lareira, que está acesa nos dias mais frios, compõe o cenário.

Passemos à comida. Para começar, um belo pãozinho cortado às fatias com manteiga e umas azeitonas maravilhosamente temperadas com alho e orégãos. Para prato principal: bacalhau à lagareiro (branquinho, bem assado, só pecava pela falta de sal e de batatas) e o incontornável (permitam-me usar este adjectivo tão abastardado) cabrito assado no forno, uma especialidade da Adega do Saloio. O cabrito acompanha com batata assada e arroz de forno com miúdos (meia dose custa €12, uma dose custa €16). Estava tudo tão bom que soube a pouco. As sobremesas constaram de um melão (demasiado maduro, como o próprio empregado avisou) e mousse de chocolate, de bela feitura. Serviço simpático e eficiente.


Adega do Saloio
Rua Álvaro dos Reis, n.º 32
Tel.: 21 924 08 37 / 21 923 14 22
Total: €37
4 estrelas

Actualização (24 de Janeiro de 2015): O bacalhau à lagareiro continua insosso. Uma pena, porque apanhei uma garfada com mais sal que estava deliciosa. Desta feita pedimos também um polvo à lagareira que, lamento dizê-lo, não estava à maneira... Demasiado seco o polvo - e duro. O cabrito, em compensação, estava fantástico. Assim como a mousse de chocolate, uma pequena maravilha. Com três pratos e sobremesa, a conta já se atirou para perto dos €50.

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Miscelânea original de Schott

Às vezes compensa não comprar os livros à primeira. Foi o caso. O Comilão encontrou a Miscelânea original de Schott na Fnac Chiado por €4,90 (ficou a 4,49 com 10% desconto do cartão). É um livrinho tipo almanaque Borda d'Água com informações úteis, informações inúteis, dados eruditos, curiosidades e futilidades. Aqui ficam alguns exemplos das listas e entradas que constam da Miscelânea: imposto sobre chapéus; mortes prematuras de estrelas pop; os filmes de Kubrik; alguns termos do latim; lavagem de roupa: símbolos...

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

O homem-sombra

Não gostava que lhe chamassem guarda-costas. Não se considerava guarda-costas de ninguém. Por isso, quando lhe perguntavam o que fazia, respondia categoricamente: 'Sou um homem-sombra'. Ao ouvirem estas palavras, as pessoas pensavam que era um artista de circo, tipo homem-bala, um super-herói, como o homem-borracha, ou um vilão dos livros, como o homem invisível. Ele via-se mais como um protector que anda sempre na peugada do protegido. De dia, fazia sempre questão de tapar o sol da cara do seu patrão e benfeitor, 'para ele não se queimar'. De noite, fazia o mesmo em relação à luz dos candeeiros eléctricos, interpondo-se sempre entre o candeeiro mais próximo e o homem por cuja segurança velava. Sentia que assim ele nunca ficava demasiado exposto. O homem-sombra levava a sua função tão a sério que a confundia com a sua identidade.

segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

a proverbial lentidão humana

Era um homem tão lento, tão lento, mas tão lento, que cada vez que entrava num museu pensavam que era uma estátua.

Era uma mulher que conduzia tão devagar, tão devagar, mas tão devagar, que sempre que chegava ao destino tinha uma multa de estacionamento no pára-brisas.

(02/01/2011)

Stefan Zweig, O Mundo de Ontem


Desde que tinha lido uma boa biografia de Zweig (Jean-Jacques Lafaye, O Porvir da Nostalgia), que o Comilão queria ler este livro de memórias.
Foi a segunda obra de Zweig que leu, depois de Hommes et Destins (Le Livre de Pôche, resenha de biografias de figuras como Proust, Albert Schweitzer, Freud, Mahler). Stefan Zweig nasceu em Viena, império austro-húngaro, em 1881, mas gostava de se considerar um europeu. Filho de um rico industrial judeu, formou-se em História e Filosofia e tornou-se um escritor cosmopolita e viajado. O Mundo de Ontem é um livro de memórias que gira grandemente em torno das duas guerras que marcaram o século XX: 14-18 e 39-45 (embora Zweig tenha falecido, ou melhor, se tenha suicidado em 42, no Brasil).
O livro começa por nos mostrar a Viena de finais do século XIX, a sua prosperidade e segurança. Era uma cidade onde convergiam pessoas de toda a Europa central e onde se respirava música e teatro. As descrições das famílias do pai, um homem rico mas poupado e discreto, e da mãe, toda cheia de si, são muito engraçadas.
Da viagem que fez a Paris terminada a licenciatura, deixou-nos um belo relato: «Em nenhum outro lugar foi possível sentir de modo mais feliz a despreocupação simultaneamente ingénua e e maravilhosamente sábia da exitência do que em Paris, onde ela estava gloriosamente comprovada na beleza das formas, na amenidade do clima, na riqueza e na tradição. Cada um de nós, os jovens, assimilou de parte desta ligeireza e contribuiu para ela: chineses e escandinavos, espanhóis e gregos, brasileiros e canadianos, todos se sentiam em casa junto ao Sena. Não havia constrangimento, podia-se falar, pensar, rir, ralhar como se quisesse, cada um vivia como lhe aprazia, sociável ou solitário, gastador ou poupado, no luxo ou na boémia, havia espaço para qualquer excentricidade e tudo era possível.» [pág. 147] «Era fácil estabelecer relações com mulheres e era fácil desfazê-las, cada tacho com seu testo, cada jovem com com uma namorada prazenteira e liberta de qualquer pudor. Ah, como era leve a vida em Paris, como era boa, sobretudo quando se era jovem!» [pág. 149]
Quando a hipótese de um conflito surgiu no horizonte, Zweig e os seus amigos pacifistas (franceses, belgas, alemães) pensaram formar uma comunidade fraternal de escritores, mas nada conseguiram contra a guerra. Algumas das melhores páginas são retratos de pessoas: Hugo von Hofmannsthal, o génio precoce idolatrado por todos os jovens escritores; Joyce; uma visita ao ateliê de Rodin; Richard Strauss; Romain Rolland, grande melómano; Freud (a história do último ano de vida do mestre em Londres é extraordinária). A viagem à Rússia em 1928 é outro dos momentos altos da narrativa. Aqui fica uma frase reveladora sobre Moscovo: «As pessoas acumulavam-se em tudo quanto era sítio, nas lojas, à porta dos teatros; em toda a parte eram obrigadas a esperar, tudo estava demasiado organizado, por conseguinte, não funcionava lá muito bem; a nova burocracia , que devia manter a 'ordem', ainda se deliciava a preencher impressos e autorizações, atrasando tudo.» [pág. 363] O grande desgosto de Zweig foi não poder ficar na sua Áustria natal, errando sem pátria por esse mundo fora: «Se havia arte que tínhamos de aprender de novo, nós, os perseguidos e desalojados daqueles tempos hostis a qualquer arte e a qualquer colecção, essa era a arte de dizer adeus a tudo o que outrora fora o nosso orgulho e o nosso amor.» [pág. 388] O grande 'orgulho e amor' de Zweig havia sido a colecção de manuscritos que reuniu ao longo de décadas, com textos autógrafos não apenas dos seus amigos escritores, mas de figuras da dimensão de Leonardo da Vinci, Goethe, Napoleão, Balzac, Nietzche, Bach, Mozart, Beethoven, Schubert, Chopin...
Óptima tradução de Gabriela Fragoso, cuidada, apesar de um ou outro erro ortográfico que não chegam para manchar o trabalho. Uma curiosidade: quase no final da leitura, o Comilão reparou que o marcador, relativo a uma exposição na Fundação Cartier, dizia em letras grandes à cabeça 'Terre Natale'. Terra natal, o lugar por que Zweig suspirou durante toda a sua vida como exilado.

Stefan Zweig
O Mundo de Ontem - recordações de um europeu
Assírio & Alvim
478 págs.
4 estrelas
€30

Marisqueira o Relento


O primeiro post do ano vai para a marisqueira Relento, em Algés. Bem merece. Foi lá que o Comilão jantou no dia 1 de Janeiro, depois de ter almoçado uma salada oceânica (nada má) e um happy meal no MacDonald's. O jantar constou quase exclusivamente de marisco. Antes de se sentar, o Comilão ficou a observar o fluxo de trabalho ao balcão: travessa de ostras sobre cama de gelo, travessa de camarões a preceito, lagostins que estavam tão frescos que se mexiam como se tivessem acabado de ser capturados.
Para começar veio para a mesa um petisco digno dos deuses. Um empregado andava pela sala a distribuir salgados (os rissois do Relento são célebres). O Comilão solicitou uma chamuça. O empregado insistiu no pastel de bacalhau (o Comilão começou por recusar, estranhamente, diga-se, pois é um grande apreciador de pastéis de bacalhau): «Pastelinho de bacalhau feito com batata nova de Viana do Castelo e cebola vermelha da Beira Baixa». Face a este esclarecimento (e recordando um capítulo de Escritores à Mesa intitulado 'Camilo e as Batatas'), o Comilão aceitou. E ficou maravilhado com o sabor do pastelinho de bacalhau. Foi um dos ágapes mais delicados que lhe passaram pela goela ultimamente. A consistência era ideal, a fritura impecável, mas o que realmente encantava era o sabor, uma coisa inexplicável e maravilhosa. Quem diria que um simples pastel de bacalhau nos poderia transportar para tais alturas? Seguiram-se 100 gr. de camarão de Espinho (das Berlengas, segundo a carta) e 400 gr. de gamba branca do Algarve, pão torrado com manteiga e imperiais. Os camarões pequeninos era uma delícia das grandes, e a gamba branca também era de qualidade superior. Para sobremesa, mousse de chocolate caseira e pudim flan, ambos óptimos. Uma palavra para o serviço: até dá gosto ver pessoas trabalhar assim, com tal profissionalismo, precisão e eficiência.

Relento
Avenida dos Combatentes da Grande Guerra, 10C
Algés
Preço: €56,40
4,5 estrelas